O contrato de vesting disseminou-se no ecossistema empreendedor como uma forma de reter talentos e promover incentivos em um momento crucial da startup, quando ela opera em bootstrapping1. Contudo, tal instituto jurídico, se não for bem utilizado, pode causar mais dores de cabeça do que soluções, pois, em verdade, o que se tem é a possibilidade de ingresso de um novo sócio.
Em essência, o contrato de vesting nada mais é do que uma opção de aquisição de participação societária, portanto, um contrato, firmado com empregado ou outro parceiro estratégico, que permite a este, em caráter oneroso, adquirir uma parcela do capital social da sociedade.
Por se tratar de um contrato, deve observar as regras gerais de contratação e validade, devendo ser firmado por agente capaz, ter objeto lícito e determinado ou determinável e ser estabelecido em forma própria, no caso, instrumento particular apto a regular obrigações recíprocas.
No geral, o contrato não prevê direitos imediatos, estando estruturado: (i) em um período de cliff ou carência, que se traduz em verdadeiro evento futuro, com data certa para ocorrer, ou seja, o conhecido “termo” do Código Civil, a partir de quando encerra o prazo de dedicação mínimo à startup sem nenhum tipo de contrapartida; e (ii) nas chamadas milestones, isto é, marcos para que o terceiro adquira a participação societária, normalmente atrelados a algum evento futuro e incerto, logo, as “condições suspensivas”, também previstas no Código Civil.
As condições suspensivas estão atreladas a hipóteses prévia e expressamente consignadas em contrato, as quais devem contar com métricas bem desenhadas e alinhadas pelo fundador, já que o contrato não pode dar margem a dúvidas, especialmente quando firmado com um empregado.
Por sinal, o contrato de vesting deve contar com as seguintes previsões: (i) cliff – prazo mínimo para aquisição do direito de exercer o direito de compra; (ii) limite da participação social que será adquirida e formas como isso ocorrerá, isto é, métricas de aquisição de participação; (iii) preço e condições de pagamento; (iv) hipóteses de resolução contratual, em que há perda do direito de aquisição da participação ou mesmo obrigatoriedade de eventual venda forçada do já adquirido; e (v) eventos de liquidez e suas consequências, isto é, caso de venda da startup ou outra situação de mudança de controle societário.
Importante ressaltar que, quando se trata de contrato firmado com o empregado, o TST (ED-AIRR-7400-93.2009.5.02.0511) já destacou o seguinte: “O plano de opção de compra de ações, instrumento que efetivamente norteia a participação acionária dos empregados, deve basear-se sempre nos seguintes fatores: i) preço de emissão da ação, ii) prazo para obtenção da elegibilidade do exercício das opções (prazo de carência ou “vesting“) e iii) prazo máximo para o exercício das opções (termo da opção)”.
Portanto, o contrato de vesting não pode e nem deve se dar em caráter gratuito, sob pena de ser considerado contraprestação pelo serviço prestado, por conseguinte, salário, aí incidindo todos os encargos provenientes (13º salário, férias, FGTS e contribuições para o INSS). Inclusive, se ficar configurada doação deverá ser recolhido o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD.
Igualmente, é possível que em dadas situações o vínculo empregatício rompa-se antes do cumprimento do termo e/ou condições, de modo que o contrato pode ser considerado resolvido, desde que não haja má-fé por parte do fundador ao tempo do rompimento da relação empregatícia e, via de consequência, contratual, como uma demissão sem justa causa, por exemplo.
Além disso, é certo que o contrato traz implicações societárias, já que haverá a figura de um novo sócio após a efetivação do direito de aquisição de participação social, o que deve ser feito por meio de um acordo de quotistas/acionistas, que deve constar como anexo do contrato de vesting, para que o potencial adquirente saiba dos direitos e obrigações decorrentes do vínculo social.
Ou seja, algumas regras devem ser estabelecidas de antemão, principalmente com relação a direito de preferência ou primeira oferta (em caso de alienação de participação social), período de lock up (tempo em que os sócios não podem vender sua participação), não concorrência, tag e drag along (compra e venda forçadas em caso de aquisição de participação social por terceiros) e aspectos relacionados a anti-diluição em rodadas de investimento, as quais costumam ocorrer por meio de venda de participação societária.
Assim, importante saber que, ao final, o que o contrato de vesting delimita é uma vinculação societária futura, que deve ser regulada antes (conforme normas contratuais e trabalhistas) e depois, onde os aspectos societários têm vez. Portanto, é um contrato que merece ser usado com cuidado, dados os riscos acima apontados.